sábado, 11 de abril de 2009

RELEMBRAR É REVER CONCEITOS

O meu processo de alfabetização foi um pouco diferente, pois o mesmo não aconteceu em uma sala de aula convencional. Morávamos na zona rural, distante alguns quilômetros da cidade de Itaberaba. Não tínhamos vizinhos que nos fizessem companhia para ir até a zona urbana onde existia escola. Nesse ínterim, a minha mãe ficou muito doente e a minha avó, que morava em São Paulo, veio nos buscar para que minha mãe fizesse o tratamento médico. Eu já havia completado oito anos de idade e ainda não conhecia a famosa Carta de ABC. Foi aí que uma tia, ao saber que eu nunca havia freqüentado uma escola decidiu tomar para si a difícil tarefa de alfabetizar-me, de ensinar-me a desvendar os mistérios dos livros, do mundo.
Com esse objetivo, todas as noites, a minha tia, ao chegar do trabalho sentava-se em um banquinho e, com uma Carta de ABC nas mãos me ensinava as letras , fazia a sabatina. Para isso, usava um pedaço de papel com um círculo no meio, no qual aparecia apenas a letra que ela queria comprovar se eu de fato aprendera. Ao constatar a aprendizagem das letras, a minha “professora alfabetizadora” partiu para o ensino das sílabas para que eu as juntasse e formasse as primeiras palavras.
Como eu me mostrasse uma aluna muito aplicada, logo recordei o ABC e uma noite, ao voltar do trabalho, a minha tia me entregou um embrulho.Ao abri-lo pulei de alegria, pois acabava de ganhar o meu primeiro livro, uma linda cartilha. As “lições” continuavam: leitura, cópia e ditado. Li e reli a cartilha. Já sabia ler e escrever...
Ao retornarmos de São Paulo, meu pai decidiu que nos mudaríamos para a zona urbana, para que freqüentássemos a escola. Meu pai me matriculou e, no primeiro dia de aula, lá fui eu com o livro num saquinho plástico e meu tamborete na cabeça, pois as escolas não tinham mobiliário. Fui para a turma da 1ª série e, pelo meu desempenho, fui logo promovida para a segunda série.
Ler e escrever, para mim não era difícil, porém a Tabuada era o maior dos pesadelos.As quatro operações era o maior dos obstáculos que eu precisava vencer. Não adiantava decorar a ‘ bendita’ pois na hora da sabatina esquecia tudo que havia estudado e a palmatória cantava nas minhas mãos . Apesar da dificuldade em Matemática nunca fui reprovada.
Lembro – me perfeitamente que a concepção de leitura, naquela época, baseava-se na crença de que saber ler era apenas decodificar e escrever, era fazer ‘composição’. A leitura não era vista como uma atividade de interação entre sujeitos e que por isso vai além da simples decodificação dos sinais gráficos e que a atividade de leitura é imprescindível para desenvolver habilidades e competências de interpretação e produção textual.
Durante o meu percurso escolar, enfrentei muitas dificuldades, devido à falta de livros, pois, o meu pai não tinha condições de comprá–los e era obrigada a tomar emprestado dos meus colegas . Sendo assim, lia apenas os livros da série que estava estudando e com muita pressa para devolvê-los aos donos.Ler histórias para mim, ninguém lia, mas ouvia muitas, em sua maioria, de assombração. Nas noites de lua, era comum, a vovó e as vizinhas nos encantarem com muitas histórias de gigantes, de fadas, de bruxas, mas, as que mais me encantavam eram as histórias de Branca de Neve e os Sete Anões, Chapeuzinho Vermelho, Cinderela e Ali Babá e os quarenta ladrões.
O tempo foi passando e, quando cursava o Ginasial, descobri a Biblioteca Municipal e não parei mais de ler, pois tomava muitos livros emprestado e graças a este “vício”, consegui meu primeiro emprego como professora leiga, aos catorze anos de idade . Fiz Magistério mas, o meu sonho era cursar uma Faculdade e, por morar no interior as esperanças de realizar o sonho, às vezes, parecia impossível, até o dia em que a prefeitura fez um contrato com a UNEB, oportunizando aos professores municipais fazerem o REDE UNEB 2000. Era a minha oportunidade. Fiz o concurso, fui aprovada, fiz o vestibular e assim realizei aquele sonho.
Ao cursar a Faculdade percebi o quanto ainda precisava aprender enquanto profissional. Percebi que a forma de trabalhar a leitura e a escrita estavam defasadas e que era necessário mudar a minha prática pedagógica imediatamente. Ensinar a ler e escrever ia muito além daquilo que era proposto em sala de aula
Após muito estudo e a Formação do GESTAR , tenho consciência de que o domínio da língua oral e escrita é fundamental para a participação social efetiva pois, é por meio dela que o homem se comunica, tem acesso à informação, expressa e defende pontos de vista, partilha ou constrói visões de mundo, produz conhecimento. Por isso, ao ensiná-la, a escola e principalmente o professor tem a responsabilidade de garantir a todos os seus alunos o acesso aos saberes lingüísticos , necessários para que o aprendiz possa posicionar-se de forma consciente, exercendo a sua cidadania.
Sendo assim, ensinar, na atualidade, requer do professor uma postura metodológica e reflexiva onde já não há mais espaço para aquela figura transmissora de conhecimento, de conceitos prontos e difíceis , na maioria das vezes sem nenhum significado para a vida
Hoje observo com tristeza que apesar de tantos livros que circulam nas escolas, de tantos livros que foram distribuídos no Projeto Literatura em Minha Casa, os educandos lêem muito pouco. Apesar de tantas discussões , de tantas reflexões sobre a função social da leitura e da escrita, percebe –se que há ainda um grande caminho a ser percorrido. É preciso que o professor seja um mediador, o que possibilitará que o aluno leia não apenas o livro, o texto, a paisagem, a imagem, o corpo em movimento, o mundo. É preciso interpretar e estabelecer significados.
É preciso criar, promover experiências e situações novas que conduzam à formação de leitores capazes de dominar e utilizar as múltiplas formas de linguagem e de reconhecer os variados e inovadores recursos tecnológicos disponíveis e que podem ser utilizados cotidianamente para que ele perceba que a leitura e a escrita são importantes na sala de aula, porque são imprescindíveis na vida do ser humano.

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